A junção da Mota-Engil com uma empresa chinesa, para se poder financiar, será um amargo engano para as expectativas portuguesas.
A moeda chinesa é para muitos uma engenhoca que tem permitido comprar empresas portuguesas ao preço de tiras de papel, se assim podemos simplificar.
A moeda de vários países como os Estados Unidos da América, Grã-Bretanha ou Portugal já não está -há muito tempo- indexada a valores reais como o ouro. O volume de negócios é enorme e não existe ouro suficiente para garantir essa correspondência. Existe apenas a garantia dos Estados.
O dinheiro que o Banco Central Europeu nos empresta ou oferece, com ar generoso, são meros números de computador ou tiras de papel de qualidade, para não poderem ser falsificadas. O Banco Central Europeu não tem qualquer fonte de receita que não seja a contribuição dos Estados e é muito murmurada uma alegada ordem de Draghi: “Passem as reservas de 1 para 3 mil milhões de euros no computador”.
Por sua vez os Estados imprimem dinheiro em conjugação com as politicas de equilíbrio do Banco Central Europeu e andamos de pescadinha de rabo na boca. Tenta-se assim manter os reais valores da economia e não os valores dos mercados. Embora os mercados se sobreponham à economia.
Tenho lido muito sobre esta matéria e tornei-me fã de Yanis Varoufakis, o ministro grego que mandou a Troika à fava.
Num livro que escreveu para explicar à sua filha a diferença entre economia e mercado, Varoufakis deixa claro que estamos presos por uma chusma de gente que não produz bens. Funcionários, policias, juízes, religiosos e por aí fora, que tiram partido do superavit. Ou seja vão ao bolo que nós produzimos. O pretexto é a ordem, a segurança, a legitimação do poder e por aí fora.
Estas subtilezas da economia e das finanças nunca foram explicadas, para que nós não entendamos o que são os mercados e quem nos vai ao bolso.
Abatemos os nossos barcos de pesca
No passado, Cavaco achou que deveríamos ser um país de serviços. E fizemos a troca por subsídios europeus. Melhor dizendo, trocámos coisas palpáveis por tiras de papel. Abatemos tudo. Acabámos com a frota de pesca, com o azeite, o leite. Aceitámos uma PAC – Plano Agrícola Comum e ficámos contentes com a massa.
Passou então tudo a vir do Brasil, Rússia, Índia e China para ser empacotado nos países europeus ricos com marcas chiques. Os portugueses, espanhóis e gregos ficaram com a escrituração.
A China aproveitou a ideia de a tornarem num grande mercado final de mil milhões de pessoas. Primeiro começou a produzir para os outros e depois para ela própria. Quem ao inicio mandava eram as multinacionais ferozes e sem pátria. Depois a China pediu para ter moeda à farta, para os chineses poderem comprar. E as multinacionais gulosas concordaram. E foi um pequeno passo até os chineses produzirem resmas da sua moeda. A última etapa foi trocá-la por dólares e euros. E pronto, os chineses afinal não eram parvos.
Passada uma geração, os chineses deixaram o chinelo e viajam agora pelo mundo e compram Portugal de alto a baixo.
Vende-se tudo até a cidadania
Esta foi a primeira pandemia. E não é necessário ler os livros todos de Varoufakis para perguntar: não seria melhor o Banco Central Europeu fazer o mesmo que os chineses fizeram policopiando tiras de papel? Ou ainda, porque razão a Organização Mundial do Comércio Livre permite que a China tenha trabalho escravo? Uma concorrência cruel e desleal. E quem deixa clonar todos os produtos? Porque se cala o Ocidente perante o esmagamento da cidade outrora livre de Hong-Kong, como se os tratados fossem para rasgar?
A Mota-Engil julga ter descoberto o ovo de Colombo. Mas quem o descobriu foram os chineses que dirigem os nossos bancos, a nossa saúde e até sectores estratégicos para a defesa nacional, como a electricidade.
E porque é que isto acontece? Porque há senhores a venderem o que é nosso. Coisas que foram construídas com suor e sangue de muitas gerações de portugueses, a ganharem salários miseráveis. Homens, mulheres e crianças fizeram hospitais, escolas, plantaram árvores e postes, meteram cabos, construíram estradas, arados e barcos, lavraram as terras, ergueram cidades inteiras.
E agora? Agora chegam uns senhores e compram um cartão de cidadão português, como quem compra um bilhete de cinema… e zás açambarcam a liderança de todas as empresas em função das estratégias de Pequim..
E os serviços de informação não reportam? E os deputados não pensam?
Para uma economia humana e saudável, Varoufakis receita o fim das contas off-shores e dos cofres privados alugados pelos bancos a portugueses nos subterrâneos da Baixa Lisboeta.