Nem o lay-off nos órgãos de comunicação social, nem os 15 milhões avançados pelo governo para pagamento de publicidade institucional vão resolver o problema das empresas de comunicação social, e dos técnicos e jornalistas que lá trabalham.
Primeiro, porque a crise é de leitores (no caso dos jornais), de telespectadores (no caso das tvs), de ouvintes (no caso das rádios) e de publicidade (no caso deles todos…) e, portanto, nem o lay-off nem os 15 milhões resolvem a crise. Quanto muito servem para ganhar algum tempo.
E se acham que estou a exagerar, reparem bem nas dívidas bancárias dessas empresas.
Por exemplo, a Impresa, que tem a SIC e o Expresso como navios-almirantes… no ano passado, a dívida líquida do grupo Impresa, a dona das marcas SIC e ‘Expresso’, subiu para 179,2 milhões de euros (mais 400 mil euros em relação a 2017).
A Cofina, do Correio da Manhã e da CMTV, deve 13 milhões e meio ao fisco e à segurança social… e, ainda assim, teve direito a receber a sua fatia do bolo dos 15 milhões, o que eu acho estranhíssimo, porque toda a gente sabe que contribuinte com dívidas não pode beneficiar de subsídios do Estado, mas enfim… Não diria que esta quantia de 13 milhões e meio é incobrável, mas tenho quase a certeza que vai ser muito difícil o estado receber esse dinheiro… mesmo se o dono da Cofina é também dono de uma das principais empresas de celulose e pasta de papel de Portugal, que é de onde lhe vem o dinheiro para estar na comunicação social…
Continuando para bingo… o último balanço da Media Capital (TVI e Rádio Comercial) mostra prejuízos de 54 milhões…
A Global Media, grupo que tem o Diário de Notícias e o Jornal de Notícias, conseguiu que a banca perdoasse 80% das suas dívidas… e o termo perdoar é um artifício de linguagem quando se quer dizer que a banca deu por perdidas todas as esperanças de conseguir cobrar esse dinheiro.
Ou seja, todas essas empresas devem imenso dinheiro ao Estado, à segurança social e à banca privada, vivem de arranjinhos com os amigos banqueiros (que usam o dinheiro dos depositantes) e dos arranjinhos com os amigos da política, a trilogia do costume – empresários incompetentes, banqueiros irresponsáveis e políticos manipuladores.
No meio disto tudo, os jornalistas e demais trabalhadores são cada vez mais mal pagos, a precarização do trabalho instalou-se, nunca o ambiente laboral foi tão mau no setor como é agora…
Nos anos 80 do século XX fiz muitas reportagens sobre fecho e falências de empresas de comunicação social… o meu primeiro emprego foi num jornal que acabou por falir, era o Tribuna e pertencia ao presidente do Sporting, João Rocha.
O meu segundo emprego foi no Comércio do Porto, um jornal centenário, cheio de história, que explorava indecentemente os estagiários (trabalhei lá um ano, todos os dias, com horário definido pela hierarquia, nunca me pagaram um dia que fosse…), acabou por falir também…
Trabalho nesta área desde 1980 e pela experiência que adquiri, por aquilo que tenho visto, o serviço público de comunicação social é o único que vale a pena salvar, os privados obedecem a outros interesses e se não são sustentáveis que fechem portas… a maravilha do capitalismo é a necrofagia de que se alimenta e, portanto, sempre que um vai à falência há outro a abrir atividade na porta do lado para se aproveitar da mão-de-obra experiente e disposta a tudo para voltar a trabalhar, sempre por menos dinheiro e menos direitos laborais, é claro.
É claro que tenho pena de ver grandes marcas da comunicação social em risco de desaparecer… a TSF é um desses casos, não só por aquilo que representa na história da rádio em Portugal, mas pelo serviço que presta à comunidade… a TSF começou por ser uma cooperativa de trabalhadores, depois foi comprada e vendida sucessivamente por grupos empresariais que nunca souberam fazer a TSF crescer, transformar-se, adaptar-se aos novos tempos, os gestores nunca foram capazes de antecipar modelos de negócio, nunca arriscaram nada e apenas se limitaram sempre a reagir… a gestão medíocre da contenção de despesas, de salários baixos, da coisa pobrezinha… e o resultado está à vista, estão todos com os pés para a cova.
Depois, há o caso do jornal Público, não sei que dívidas tem, mas pertence à SONAE e portanto quem aguenta com o prejuízo do jornal é o grupo económico… e por fim temos o Observador, um projeto empresarial, tem uma matriz política de direita democrática, não conheço as contas da empresa mas parece que não aceitou a fatia que lhe cabia dos 15 milhões que o governo disponibilizou.
A SIC, a TVI, a Global Media, a Cofina, qualquer contabilista tosco vos dirá que vivem nas vascas da agonia e que sem o constante amparo do estado já há muito que teriam fechado portas…